A luta contra as repressões da psiquiatria
arcaica: as Comunidades Terapêuticas e a Antipsiquiatria.
Como foi trabalhado na postagem
anterior “Estigmatização da loucura no aspecto histórico social” a percepção
social que orientam a prática de lidar com os doentes mentais, os ditos loucos,
se distinguiram, mesmo que em poucos aspectos, nos diferentes períodos
históricos. Iremos trabalhar nesta postagem algumas experiências
teóricos-assistenciais importantes que foram desenvolvidas na Reforma
Psiquiátrica, a Antipsiquiatria, e as Comunidades Terapêuticas.
Após a Segunda Guerra Mundial, viu-se a
necessidade de um projeto de reforma psiquiátrica contemporânea, em forma
crítica às práticas em instituições asilares. Questionava-se o papel dos asilos
e as técnicas psiquiátricas. Na década de 1940, Maxwell Jones delimita o termo
Comunidade Terapêutica, que caracterizou reformas no âmbito psiquiátrico
destacado por métodos administrativos, democráticos e coletivos. A
institucionalização dos pacientes dos hospitais psiquiátricos era comparada,
negativamente, às pessoas em campos de concentração na Europa. Uma das
propostas da Comunidade Terapêutica foi a terapia ocupacional ou terapêutica
ativa, instituída por Hermann Simon na década de 1920, e o método teve
efetivação, principalmente, em pacientes considerados crônicos (AMARANTE,
1998).
Segundo Amarante (1998), Maxwell Jones foi o autor e operador
mais relevante dentro da Comunidade Terapêutica, sua ideia era que a função
terapêutica fosse dos técnicos, pacientes, famílias e comunidade. Para isso,
ele fez com que os pacientes tivessem grupos de discussão e atividades, e fazia
com que esses se envolvessem com suas terapias e com as dos demais. Na
Comunidade Terapêutica tratava-se o grupo como um corpo psicológico unificado.
Essa ideia era para desmistificar a segregação antes trazida pela psiquiatria e
o sistema hospitalar, e para não segregar técnicos de pacientes, havia uma
reunião diária com todos ali presentes. Trouxe também a ideia de “aprendizagem
ao vivo”, que consiste em poder agir assim que os conflitos surgem em situações
reais e presentes (JONES, 1972 apud AMARANTE, 1998).
A antipsiquiatria surgiu na década de 1960,
formada por um conjunto de psiquiatras, caracterizou-se como um movimento de
resistência contra os hospitais psiquiátricos e sua demasiada expansão. Se fez
uma crítica às tentativas de adequação dos comportamentos, na qual, o louco
deveria ser contido, acarretando uma restrição da criatividade e da
espontaneidade. Para além, preza não somente a luta contra as repressões dentro
das instituições psiquiátricas, mas também toda a ação psico-tecnológica fora
dela. Nesse sentido, compreende-se as ações psico-tecnológicas como a teoria
que orienta as práticas psiquiátricas, como a psicanálise, a psicologia,
terapias alternativas, os meios de castigos e recompensas utilizados em
tribunais, prisões, sendo entendida como inadequada, já que se trata de pessoas
e não de coisas para utilizar tecnologia (COOPER,1978).
Há críticas em relação
ao poder atribuído aos médicos psiquiatras em delimitar o que pode ser
considerado normal e patológico e sua ideologia de salvação dos que estão
perdidos. Destaca-se o uso de drogas psicotrópicas exageradamente e as
vantagens para a burguesia da manutenção desses comportamentos. Assim, há o
enfoque no indivíduo e seus comportamentos individuais isoladas do mundo
social, como se os problemas pessoais fossem desconectados de influências
políticas ou a possibilidade de serem mantidos para benefícios dessa. Nesse
sentido, um bom exemplo é a discordância com a psicanálise ortodoxa, que mantém
a família como controlo social, no modelo mãe-pai-filho, o édipo de forma generalizada
em todas as culturas e ocultando e alimentando cada vez mais o alienismo da
realidade (COOPER,1978).
Lidando com esse assunto, Amarante
(1998) pontua que a loucura é um fato social e político que visa a
segregação para que não haja um desequilíbrio na ordem social. Nega-se às
experiências individuais, trabalha a imagem do louco como perigoso e ao mesmo
tempo o silencia. Não se trata assim, de um estado patológico ou da procura de
tratamento. Denuncia também a concepção da loucura como entre os homens e não
dentro deles, critica as instituições asilares como isoladores da sociedade e
propõe um tratamento terapêutico centrado no discurso e nas experiências
individuais do louco.
A fim de ilustrações sobre a
antipsiquiatria, deixamos um vídeo que traz de forma didática a temática: https://www.youtube.com/watch?v=Ruy3-ZJMtMw
Conclui-se que esses
momentos, embora tendo origens semelhantes, se diferenciam. As ações que visam
as Comunidades Terapêuticas acreditam nas instituições psiquiátricas como um
local central de tratamento e no saber psiquiátrico como uma teoria capaz de
realizar o tratamento. Já as práticas da Antipsiquiatria ou da não-psiquiatria,
visam a ruptura deste modelo de tratamento, realizando críticas ao saberes
teóricos e práticos da psiquiatria, além de preocupar-se com esse conjunto de
relações entre teoria/prática/instituição, conceituando-os como incapazes de
lidar com a complexidade do fenômeno que se tem como objeto ou de negarem sua
complexidade (AMARANTE, 1998).
Referencias
AMARANTE, P. coord. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica
no Brasil [online]. In: _______. Revisitando os paradigmas do saber psiquiátrico:
tecendo o percurso do movimento da reforma psiquiátrica. 2nd ed. Rio de
Janeiro: Editora FIOCRUZ, 1998. Criança, mulher e saúde collection. ISBN
978-85-7541-335-7. Disponível em SciELO Books .
COOPER, David; RAMOS, Vanda. A invenção da não-psiquiatria. In: ______. A linguagem da loucura. São Paulo: Martins Fontes, 1978. p. 115 - 150
Ótimo trabalho! Adoramos a forma com que escreveram fazendo uma ligação com o contexto histórico. Ademais, as conceituações contribuíram para uma boa compreensão do conteúdo elaborado.
ResponderExcluirUm beijo e esperamos continuar acompanhando o trabalho de vcs.